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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

RIQUEZA DA ORLA - O RIO SÃO FRANCISCO EM SÃO FRANCISCO

“Formosa cidade de São Francisco -
que é a que o Rio olha com melhor amor”


Guimarães Rosa
Grande Sertão: Veredas






A beleza de nosso Rio São Francisco, se mostra nos mais diversos mosaicos. Aos meus olhos nunca superam as expectativas que têm ressonância na alma.
Diante das quadras que se renovam a cada manhã ou tarde, fica a pergunta: por que este fantástico tesouro não desperta a atenção maior de vários setores de nossa comunidade em especial dos administradores?
São Francisco teria muito que ganhar com tanta beleza se ela fosse tomada como uma atração turística, ainda que própria do período das chuvas, quando tudo fica mais verde e surgem os banhados pluviais. E claro, sem se esquecer do cenário majestoso, sempre belo e esplendoroso do Rio São Francisco, nossa razão de ser.
Que cenário! O são-franciscano não sabe explorá-lo bem – talvez dele se aproveitem, sem muita atenção, as pessoas que fazem as caminhadas matinais e vespertinas. Aqueles que olham com mais cuidado, que colocam atenção maior no que veem e escutam, deparam e se deliciam com um cenário e um mundo maravilhoso.
Vejamos: na Escola Caio Martins, uma mata ciliar, um bosque muito bonito, plantado pelos alunos da instituição, o que pode se transformar em um parque onde as crianças vão encontrar muitos micos e aves em profusão. Depois passa-se pela tradicional rua do Quebra (João Pitanguy), cenário de belas páginas da história de São Francisco é possível, voltando no tempo, assistir às apresentações, de Badé e Pomba
Triste, à frente de mulheres de branco cantando e dançando para São Gonçalo. E pode mais, fazer parte de um rodada do Carneiro.
Chegando-se à Praça dos Pescadores, hoje moderna, com belos prédios e jardim, pensamento vai ao antigo porto, onde chegavam os pescadores do Quebra.
Dali, segue-se por uma mata ciliar - nativa, recompondo-se com essência vegetal variada, sobressaindo-se o angico branco, a gameleira e muitos pajeús.
Ponto de parada é o penedo onde nasceu a cidade, então Pedras de Cima, Pedras dos Angicos, hoje com a Matriz e o Cruzeirinho como ponto determinantes da civilização, ponto observado por cientistas viajantes no século XIX. Mais na frente, descendo para o cais mais antigo, embarra-se na quixabeira bicentenária, regada com as lágrimas de índias pela perda de seus guerreiros para a Iara com seu canto envolvente, misterioso.
Ali perto, então, o cais com a ala de frondosas mangueiras (lembrança de Zedir) seguindo o balaústre, debruçado sobre o rio que guarda tantas histórias, cantadas ou contadas pelos búzios de velhos pescadores como João Búzio e Gino na matina chegando da pescaria com canoa farta de dourados, surubins e curimatãs; quantas histórias desembarcadas nos vapores trazendo famílias de nordestinos que fincaram raízes em São Francisco - Barbosa, Ferreira, Ferraz, Figueiredo, Cavalcante e tantas e tantas. Vapores! Vapores!
O portentoso Peixe-Vivo e o Clube Campestre Carquejo, a sequência.
Depois, um bosque fechado onde se vê uma interessante e variada flora: aroeira, pajeú, canafístula - com suas flores amarelas nesta época do ano - e as periquiteiras forradas de brancas flores, também nesta época; o tamboril, que não pode faltar; são joão, juá-mirim, caraibinha branca (a perfumada), mutamba, gonçalo, quixabeira.
Passando para o outro lado do aterro, o alagado que se forma no período das chuvas, resultado do próprio aterro que separou a cidade do rio. Ganhou-se, pelo menos, o alagado e é dele que vem o encantamento da fauna alada: patorim, frango d´água, ariri, mergulhão, peixe-frito, curicaca (com intenso barulho) e, incrível, o maçanico que apareceu neste ano, tão imponente com seu bico comprido e recurvado, e peito vermelho e a casaca preta; garças e uma variedade formidável de pássaros – melros às centenas, sabiá, bem-te-vi, cabecinha-de-fogo, joão-de-barros e tantos outros.
No alagado próximo do Peixe-Vivo a incidência de matéria orgânica é elevada propiciando proliferação da taboa (ninhário dos melros) e aguapé, um tapete de flores roxas, onde passeiam os frangos d’água.
E lá no fundo do bosque o chamado da juriti, em triste lamento que diz Abdias (juiz de paz da cidade) tratar-se do desesperado chamado do companheiro, certamente arrebatado por um gavião.
Aos primeiros sinais do alvorecer, quando o céu se tinge de suave vermelho, bordando esparsas nuvens brancas, o mundo alado se desperta, confundem-se os cantos no fantástico alarido. De repente, saem em revoadas, grandes e pequenos. Maçanicos e mergulhões, em vôo alto; garças em vôos razantes, quase tocando as águas do rio. Uns, bordam o céu de pontos negros reluzentes; outros, pontilham de branco as águas vermelhas do rio.
Voltam todos, à tardinha, para o repouso noturno. Sem alarde, apenas pios de aconchego, de prece diária.
É um mundo fantástico que deveria ser mais explorado e estudado, tudo tendo como cenário de fundo, o Rio São Francisco, que todas as tardes, enche os olhos dos passantes com o seu maravilhoso pôr-do-sol. Precisa mais?
Aproveitando o embalo, vamos aprofundar na alma poética do homem, no se folclore, lembrando versos de canções que já embalaram muitos foliões e dançarinos, daqui e no Sul.

Do ariri: Vai tum, vai tum, vai tum, ariri, vai fazer seu ninho. Coitadinho do ariri, ele vai fazer seu ninho, na gaia do pau mais alto, lá na beira do caminho. (Dirceu Lelis, o nome ariri, aqui dado a essa espécie de marreco não é conhecido nos compêndios, como você observou - tente irerê)
Do maçanico: Maçanico, maçanico; maçanico do banhado; quem não dança o maçanico, não arruma namorado”.
É tudo tão belo, tão presente do Criador de todas as riquezas.