1. A torre
Domingos do Prado deixa o barco no rio São Francisco,
Galga empinado penedo forrado de angicos
E no alto finca o sinal da cristandade – a cruz!
Então, desde os tempos imemoriais, ela vigia o rio.
Nos tempos mais modernos do chão ao mais alto,
Ela ganhou o cume da torre da imponente igreja
Sinal visível de nossa terra nos dois pontais.
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2. Os angicos
Domingos do Prado aqui fincando sinal primeiro,
A civilização que nascia, escolheu um nome
E o primeiro foi, em razão do penedo, Pedras de Cima.
Logo depois o lugar foi batizado de Pedras dos Angicos,
Tamanha a profusão da bela e altaneira árvore.
E ainda hoje ela teima em se espalhar pelas barrancas
Vigiando como sempre fez, o nosso São Francisco.
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3. Quixabeira
Ainda viajando na busca dos tempos passados,
Os olhos do caminheiro contemplam um tronco secular:
É a velha quixabeira de lágrimas indígenas molhada.
Quixabeira, índias e guerreiros uma bela história de amor,
Nascida no canto melífluo e envolvente da Iara
Que em noites de lua cheia no rio estendida como prata,
Guerreiros levava para o fundo do palácio encantado.
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4. As flores
É de se ver no caminhar extasiado pelos caminhos-barranco
Como se esparramam flores na relva que desce às águas
Ou que cobrem em singeleza um tapete de fundo verde
Nas lagoas formadas pelas mãos dos homens
São puras flores roxas que nos remetem aos versos
De Catulo da Paixão Cearense na lembrança de Jesus:
“Por que nasceu roxa a flor do maracujá” – é amor e paixão.
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5. Mais flores
Muitas flores vê-se no correr do ano, no seu modo de vir
Caraibinha branca, pajeú, periquiteira, canafístula...
No caminhar do mês de maio, uma antecipação:
Flores de mangueira e moldurando o retrato do rio.
É a riqueza do sertão – flores e frutos para o homem
Os olhos se encantam sempre e levam paz ao coração.
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6. A canoa
No barranco aportada, à sombra de angicos e pajeús,
Descansa uma canoa, lida do pescador em noite de peleja
Uma sensação de paz imensa, gostosa, no balançar suave;
Mais ainda os beijos das marolas feitas da brisa da manhã
Só de olhar a cena, o descanso toma conta do espírito
Que se revigora para mais uma jornada de trabalho no dia.
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7. Na trilha
Descendo a trilha do barranco ao molhado do rio,
Sinal dos pés, em tempos tantos passados, do pescador,
Desvencilhando-se de pedras negras ali espalhadas,
No jardim natural de mamonas e algodão manso,
Que brotam na mata do barranco por natural de ser
Plantas que a natureza cuida de ter e não faltar.
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8. O jumentinho
Se lembrado foi Jesus, na flor roxa rasteira,
Outra lembrança Dele se tem, mais um pouco do andar
Quando os olhos alcançam um jumentinho no descansar
Plácido animalzinho, resignado de ser no seu pastar
Ele que lembra a peregrinação de Maria e José
No caminho do Egito na fuga da ira de Herodes.
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9. Ninho dos melros
No mesmo cenário do sossego do jumentinho distraído
Forra a lagoa o denso verde das taboas que se abraçam
Ali, no depois da madrugada, vê-se a festa dos melros
Que se preparam para o vôo matinal, saída do ninho.
E assim, o despropósito da água servida quase fétida
Se veste de beleza, de graça e de muita música no ar
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10. Os pássaros
Rio, barranco, brisa, trilha, e olhares extasiados
E uma vida telúrico vai se arranjando aos olhos
Ali, um bem-te-vi intrometendo-se com a vida do passante:
Bem-te-vi! Viu o quê? Visto é ele se equilibrando no fio.
O cabecinha de fogo, escondendo-se nas galhas secas
O casalzinho de mimosas aves marrons vigiando o rio.
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11. A Família
Antes que mais se levante o sol, esquentando o dia
Uma família de anu preto aquece as asas para o vôo matinal
Juntam-se com carinho tanto de fazer inveja ao passante.
Outros se perdem no namorar, ali tão esquecidos
Gostosamente unidos, se esfregando e cantando o amor.
Passarada que fazem o belo espetáculo do raiar do dia.
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12. Os distraídos
No caminhar pelas barrancas do meu rio, há de tudo ver
Ali, uma mulher distraída, perdidas em seus pensamentos,
Com os olhos descansados nas águas mansas do rio
Não se sabe o que ela pensa, mas o que vê, na vigília
É um rio que passa, como passa nossa história, nossa vida
E ali por perto, um cachorro procurando caminho...
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13. Rua do passado
Saindo do cercado da lagoa, lá para meio da cidade que dorme,
Uma velha rua, das mais antigas, espreguiça nas cores da manhã.
Em tempos escorridos, foi ela trilha dos pescadores rumo ao rio
Na esperança de ter a farta pescaria, em tempos muito piscosos.
A pequena rua dorme, nenhum sinal de vida, só sua história.
A cidade que chega ao rio porque dele nascida e vivida.
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14. Caminheiros
Raios do sol pintam de vermelho a linha do horizonte. A luz.
Na trilha o movimento vai se intensificando, os caminheiros.
Sorvem eles o doce aroma da brisa da madrugada que vem do rio
Se atentos e desligados das coisas comuns do mundo
Podem ver a natureza coroando-o de belezas variadas
A revoada de maçanicos, riscando o céu azul, uma arte.
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15. E mais
Vai passar o caminheiro, com suas passadas apressadas
Pela placa em abandono indicando o bar ribeirinho
Vai deparar em um galho seco com um gavião na espreita
Passar pela solitária sete copas, onde foi dos angicos
E vai ver, por fim, e certamente com muita tristeza
O lixo que o presenteia o nosso rio. Ele porém vence tudo.
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16. Sou feliz
Assim, tenho as mais belas e encantadas manhãs.
Tenho a visão serena do meu Rio São Francisco
E se me detenho um minuto, ouço a sua doce canção.
Tenho as pessoas que passam e abanam a mão e dão um sorriso.
Tenho as flores coloridas e perfumadas
As aves revoam no meu céu e me cumprimentam do alto
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Aí, com o coração pleno de amor,
Agradeço a Deus, por tudo.