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sábado, 6 de outubro de 2012

RIO SÃO FRANCISCO – 511 ANOS DO DESCOBRIMENTO

          OPARA – uma visão extraordinária aos olhos do navegador Américo Vespúcio no dia 4 de outubro de 1501. Era o Brasil um território desconhecido, bravio, fantástico, com um ano e cinco meses de descobrimento. Teria que ser batizado o fantástico caudal que invadia com águas o Atlântico. O santo do dia era São Francisco e, assim, seguindo o costume da época, deu o navegador, ao rio, o nome do santo. E foi por sorte e muito apropriado, pois São Francisco é o santo amigo das águas, do sol, da lua, dos animais, enfim, da natureza. De Opara, dos índios, ao São Francisco, dos civilizados.
 Quinhentos e onze anos passados. Pergunta-se, hoje, comparando o rio da época do descobrimento ao seu estado atual, em relação aos cuidados que lhes são dispensados, quem  para ele seria mais importante, os índios ou os civilizados?

           Daquele estado virginal, puro, farto de água e vida aquática, o que chegou ao século XXI é constrangedor. O desenvolvimento de forma desordenada, sem uma política de acompanhamento sustentável, transformou o rio no lixeiro das civilizações ribeirinhas, depositário de esgoto humano, de resíduos tóxicos das indústrias e o caixão para ser entulhado das areias do cerrado que substituem as águas puras que desciam das veredas. Outra contribuição para tão grande degradação vem dos afluentes, quase todos igualmente poluídos. O homem atacou o cerrado, despiu-o totalmente, pois usinas de boca de fogo exigiam, cada vez mais, os troncos retorcidos de suas árvores para alimentá-las. A devastação restou aos gerais. Campos nus de vegetação onde a água abençoada das chuvas não mais é guardada, e passa a correr livre, carreando areia e abrindo ravinas campos afora.
           Lá embaixo, na calha maior, a água foi faltando e a areia aumentando.
           A ordem da navegação pelo São Francisco era assim: canoas, barcaças e, por fim, os vapores. Ordem direta das embarcações que singravam o grande rio ou Rio Grande, como o tratavam carinhosamente os campineiros. Agora, na ordem do “já teve”, ficou assim: vapores, barcaças e canoas. Sim, atualmente somente as canoas ou pequenas embarcações podem singrar suas águas com maior desenvoltura. Quanto às embarcações de maior calado, preciso é esperar o benefício das chuvas.
           Peixes? Revelam estudos recentes que estão praticamente em fase de extinção os que têm habitat no fundo do leito, meio à lama e algas – é onde ocorre a sedimentação dos metais pesados e tóxicos das indústrias. Morrem em grande quantidade, cardumes e mais cardumes de enormes surubins que descem o rio numa dantesca e aterradora visão. E aquele cenário de mulheres à beira do rio limpando baciadas de peixes para as peixarias é de pálida memória. Era um tempo em que o barranqueiro se fartava de comer peixe e era tanto que maliciosos de outras bandas faziam o mote: “barranqueiro não trabalha, vive de comer peixe com abóbora”. Não era de todo verdade. Comia-se muito peixe sim, pois havia fartura. E quem não gosta de peixe? Que carne é mais recomendada ao consumo humano?
           Hoje, ter à mesa um peixe, tão farto antigamente, é coisa para rico.
           Quinhentos e onze anos de existência heróica, tão judiada e ainda servindo aos homens... e aos políticos. Imagine só, fazer a transposição de suas águas! É o mesmo que tirar o sangue de um quase moribundo para salvar outro moribundo. Imagina só implantar a hidrovia no rio que hoje não passa de fina lâmina d´água! Teria que tirar o “hidro” do projeto.
           Por que será que, deveras, os governantes com seus tecnocratas e criadores de leis não pensam o Rio São Francisco num quadro de realidade?
           Por que não debatem com as populações ribeirinhas e do cerrado sobre a política de salvação e preservação do rio?
           Por que não investem em programas sérios e viáveis, tratados com as comunidades locais, para recuperar a bacia do rio?
           O que têm feito os governantes para recuperar e preservar o Rio São Francisco?
           Barraginhas? Isto os municípios fazem com muito trabalho e esforço, alguns  com seus recursos. Como se sabe, diante do enorme estrago de muitos e muitos anos, isto quase nada significa, senão a seguir a lição do “beija-flor diante do incêndio da mata”.
           Rio São Francisco, quinhentos e onze anos. Tanto recebemos dele e quase nada devolvemos. Ainda assim ousamos comemorar, porque queira sim, queira não, ele ainda é o nosso maior tesouro, a nossa vida.
           Parabéns, velho e novo Chico.

UM  DETALHE  HISTÓRICO


           O mundo teve o primeiro conhecimento do Rio São Francisco em 1501, no encontro dele com o oceano Atlântico.
           Passou-se um período, de meio século, em que ele ficou guardado, pois a coroa portuguesa estava voltada para a exploração e comercialização com as Índias. Aí, exauridos os recursos que os portugueses buscavam no Oriente, os olhares se voltaram para a Terra Nova, o que segundo Cabral poderia ser apenas um arquipélago que recebeu o nome de Terra de Santa Cruz. Preciso era explorar a terra descoberta que, então já se sabia ser continental e alvo das cobiças de diversos países europeus. Foram sendo criados núcleos na área costeira e, por fim, em 1549 instalado o governo geral.
           Nessa nova fase partiu-se para a exploração do interior com a busca de ouro e pedras preciosas. Formadas as expedições e bandeiras com homens intrépidos e padres para catequizar os índios. Numa dessas expedições estava o padre João de Aspilcueta Navarro. Ela partiu de Porto Seguro e embrenhou-se pelo sertão-oeste 360 léguas de todo tipo de obstáculos e contatos com índios até que chegaram a uma região muito perto, pertinho mesmo de São Francisco – na barra do Rio Mangaí, que corta nosso município pelo Norte, nas divisas com Pedras de Maria da Cruz..
           Segunda descoberta do Rio São Francisco, o que assim foi registrado pelo padre Aspilcueta:
           “Daí partimos e fomos até um rio caudal, por nome ‘Pará’, que segundo os índios nos informaram é o rio de São Francisco e muito largo (...). E assim começou cada um a fazer o que não entendia porque não tínhamos carpinteiros; e assim nos assentamos em uma aldeia junto da qual passa um rio por nome de Monail (Mangaí) que vai dar no outro (São Francisco)”.

           Então, maior é a nossa relação com nosso Rio São Francisco, coisa de nascença.