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Vencendo curvas, mata-burros e buracos destampa-se um pequeno povoado. O primeiro conta-to é com o humilde cemitério – céu aberto de sol escaldante, de impressão causar aos olhos de ver fu-maça ascendendo aos céus. Ali, meio a toscos túmulos, debaixo de um pé de mutamba (camacã) – co-mo queria – o túmulo do mestre Minervino. Então, o reverencio com um pensamento de saudade, lem-brando do nosso primeiro encontro em sua humilde oficina (uma banca) debaixo de um pé de xixá, encostada em um umbuzeiro. O primeiro encontro aconteceu no exato dia de Bom Jesus da Lapa, 6 de agosto de 2002. Era tudo tão seco, como agora, por isso tanta saudade. Através do informativo Car-ranca, da Comissão Mineira de Folclore, tirei o mestre Minervino da grota do Surucucu, dando ampla dimensão do seu importante trabalho como artesão, tornando-o conhecido em sua arte como notável fazedor de violas caipiras e rabecas – ele ganhou o Brasil e, com isso, construiu uma oficina de alvena-ria, espaçosa e coberta com telhas. Ali, começou a ensinar a jovens da região através de um projeto do IPHAN. Aproveitou pouco, pois seu encantamento se deu breve tempo depois. Contudo, ele deixou uma semente – o jovem Geraldinho mantém o padrão da sua viola, na oficina da Cultuarte, na cidade. O mestre Minervino não morreu.
Subindo um leve tope, vislumbra-se a igreja do povoado – pequena, singela, mas bonita, ali do alto dominando a paisagem.
De estirão abaixo, chega-se ao ribeirão do Angical. Famoso, no nome e na valentia passada e, ainda, por uma barragem inútil. Chegando-se ao leito do ribeirão, que tristeza! Onde corria muita água, de grandes cheias, de força tal que foi capaz de carregar a ponte de madeira ali existente, o que se via, agora, era pó, tauá e pontas de pedras. A estrada corta o leito sem dificuldade, tão plano ficou.
Dali para frente a topografia era outra, bem diferente à dos olhos acostumados na direção con-trária, de onde partimos, e mais além, atravessando o São Francisco à depressão urucuiana. Inicia-se uma subida, coleando pequenos vales e pedreiras.
Curvas, rampas, pequenas propriedades encontradas pelo caminho – umas bem edificadas, bo-nitas; outras humildes, muito pequenas, todas porém com dignidade. Rebanhos de bovinos apareciam em recantos de pastos. Vacas com bezerrinhos serelepes incrivelmente gordos, considerando a seca brava que assola a região.

Viagem à frente e nada de chegar ao destino.
O sol já descambava no horizonte, anunciado a despedida do dia. E nada de chegar o destino. Surge num amplo terreiro, uma bela casa com cerca de madeira à frente. Bem à hora para buscar informação, pois já nos considerávamos perdidos no sertão. O morador, gentilmente, voz mansa, dá a orientação: aqui fica perto de Lapa do Espírito Santo. O des-tino que buscam ficou para trás, coisa de quatro mata-burros passados. É descer de volta, encontrar uma placa anunciando a estrada para a Igreja da Taboquinha e seguir por ela. Foi o que fizemos. De-pois de bem rodar por uma estrada quase intransponível tão cheia de pedras e buracos bem no meio do leito, ainda com tantas cancelas, antes não vistas, enfim chegamos à Igreja da Taboquinha. O sol já escorregava rumo ao ocaso. Preguiçosamente ele se deitava sobre a galharia seca que se estendia além do de se ver.


O sol cai mais. O horizonte virava um mar dourado esvaindo-se para o plúmbeo – seria noite chegada breve. Não era possível aguardar os foliões, pois o receio da volta, sem conhecer a estrada, era grande – preciso era empreender o regresso sem muita delonga. Contudo, uma esbarrada foi preciso, ainda que aproveitando os quase adormecidos raios do sol. O convite irrecusável veio de uma porten-tosa xixá carregada de frutos.


Ainda tivemos o momento final, o das poses para registrar a despedida do sol. Pôr do sol no al-to da serra da Taboquinha contemplando o horizonte distante, uma linha marcada pela mata seca.
O sol se despediu, enfim. A noite caiu de vez. Ganhamos a estrada de volta muito entusiasma-dos, felizes com o presente que nos proporcionou a natureza. E o papo foi animado, lembrando os detalhes.
Mais uma vez – nos gerais ou nas chapadas; na beira de uma vereda ou na barranca do meu rio; nas matas de galeria ou nas ciliares – o sertão me mostrou a presença do Criador. É preciso estar em paz de espírito para solver sua divina presença em nossa vida. Um meio dos mais gratificantes é pela natureza e, claro, no convívio com o humano que irmãos somos todos nós.